segunda-feira, 26 de julho de 2010

Comentário sobre "A dança", de Klauss Vianna

Se fosse um livro, seria muito comum obter-se uma resenha dele. Mas o fato é que sua coerência não parece somente a de um escrito, e sim a de uma dança mesmo. Até seu nome é propício para essa fluidez. Sua objetividade tem um ritmo que nos conduz em todo o tempo de leitura, e que nos faz querer agir conforme o livro, mover-se de alguma maneira, fazer alguma coisa: dançar, por exemplo...


Ao unir a sua vida com sua técnica, deixa bem claro que a dança não serve para se decifrar nem definir, mas para viver, perceber e dançar.

A maneira como narra o começo d’A Dança, impressionou-me que fosse um diário, um relato ou uma confissão, causando-me certo instante de rejeição por isso. Mas logo envolveu e se identificou como correspondente à vida do artista em geral, não apenas à de Klauss Vianna. Ou mais: a vida da dança. “A arte é antes de tudo um gesto de vida.” (pg.52)

Com esta dança, Klauss Vianna traz um caminho para deixarmos passar as inquietações enquanto seres humanos diante do mundo. O modo de ensinar já lhe é tão apropriado naturalmente, que nos esclarece de forma tão simples um jeito tão complexo de dançar/ atuar: de acordo com a nossa própria vida!

É neste ponto onde se refere ao auto conhecimento, dizendo que a verdade está em cada um, e a partir daí, desta individualidade é que iremos contribuir a uma forma de expressão coletiva entre: seres, natureza e universo.

Insiste em desinteressar-nos por uma técnica, mas para isto utiliza sim um processo: o da busca. Não parte nem da técnica nem do resultado intuitivo, mas de um meio como associar, na dança, o significado dessas duas chaves no trabalho pessoal de cada bailarino: “Procurar a pérola sem intenção é a chave do mistério” (pg.50).

Isto vem sempre de acordo com a energia biológica produzida desde o interior do nosso corpo, determinando então o movimento em exercitá-la até que as nossas próprias articulações forcem movimento e atuem com as oposições (expansão, recolhimento e assim por diante), num controle de tensão conforme o que queremos em um espaço.

Essa energia vital dependerá diretamente do que somos: da região onde vivemos, do que fazemos, pensamos e sentimos. Tudo isso embutido naturalmente no corpo, diagnosticará um modo exclusivo, uma forma pessoal para a arte de cada um (partindo de cada pessoa, para cada região, cada país etc) poder se encaixar na espiral e atuar junto com o universo.

“Resumido em compressão e expansão, o movimento humano tanto é reflexo do interior do homem quanto tradução do mundo exterior. Tudo que acontece no universo acontece comigo e com cada célula do meu corpo. A espiral crescente, o universo, tem um ponto de partida em cada um de nós, e é do nosso interior, da nossa concepção de tempo e espaço, que estabelecemos uma troca com o exterior, uma relação com a vida.”

“Para dominar uma técnica é preciso incorporá-la inteiramente: só assim o movimento flui com naturalidade e o bailarino dança como respira. Então , já não há mais preocupação em conseguir uma técnica. Por isso costumo dizer a meus alunos: eu não danço, eu sou a dança. É o que gostaria que todo bailarino sentisse”(pg.81).

Essa lógica coerente assegura as palavras do autor e a modernidade de seu pensamento traz esta capacidade de formar e informar as nossas necessidades contemporâneas conquistando a trajetória do conhecimento. Mas o desejo dessa fácil pretensão é do tamanho da dificuldade em conseguir tal conscientização, devido ao fato de ainda enrrigecêrmos o mundo, em vez de alongá-lo...

“Quando iniciamos um trabalho corporal, há todo um processo que vai da fertilização ao nascimento. Quando iniciamos um trabalho com as articulações, existe um momento que corresponde ao instante da fertilização, existe um longo processo de gestação e, finalmente, o parto” (pág.100).

“ A vida é a síntese do corpo e o corpo é a

síntese da vida.”

escrito em janeiro de 2004 - São Paulo.

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