segunda-feira, 26 de julho de 2010

Brainstorms:a mente e a psicologia - D. Dennett

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
Campus Guarulhos
Curso de Filosofia – Noturno
Disciplina: Filosofia das Ciências – Reducionismo Neural
Professora Responsável: Marisa Russo
Aluna: Cristilene Carneiro da Silva
Nº matrícula: 50043

Resenha crítica sobre o livro
“Brainstorms: Ensaios filosóficos sobre a mente e a psicologia” ,
de DANIEL C. Dennett:

CAPÍTULO 11: POR QUE NÃO SE PODE CONSTRUIR UM COMPUTADOR QUE SINTA DOR

SÃO PAULO
21/06/2010


INTRODUÇÃO

O capítulo referente à questão de “por que não se pode construir um computador que sinta dor” aqui vigente, é desenvolvido a partir de uma estrutura dividida em três partes onde o autor Daniel C. Dennett articula suas investigações sobre uma teoria que suporte as adversidades céticas levantadas contra a possibilidade da construção de uma máquina que simule a dor, assim como o foi feito com a inteligência artificial por meio do computador. Onde, primeiramente, o autor supõe a hipótese de tal construção, depois apresenta um modelo de teoria e a expõe, para finalmente analisar sua probabilidade.

DESENVOLVIMENTO

A discussão se inicia com a problemática dividida em duas vertentes comportamentais nos padrões de artificialidade já tentados até então: os aspectos que foram receptivos a programas sistematicamente desenvolvidos, que seria o caso do nivel pensante ou sapiente, e os que foram resistentes aos mesmos programas, os sencientes ou sensíveis. Tal distinção é apresentada de início afim de argumentar que:

“A tarefa de fazer uma máquina sentir é muito diferente de fazê-la pensar; em particular não se trata de uma tarefa que peça soluções simplesmente por inovações sofisticadas na programação, mas ao contrário, se tanto, por projetar novos tipos de hardware.”

Pois trata-se de articular a hipótese de montar um computador com dor, porém por meio das descrições da mesma em comportamentos subseqüentes, ou seja, um programa com predições em situações variadas e compostas, conforme o próprio exemplo dado no texto: se A, B, C, D; então R. Logo, através do geral disporía-se o particular, ordenadamente sistematizado nesta “teoria” comportamental que seria apenas representativa e descritiva da maneira como é o processo de como a dor se daria nos humanos:

“A teoria incorporada no programa dirige o comportamento da apresentação, e não interpreta o comportamento dela, em si mesmo não desempenha nenhum papel na simulação além de seu papel como um mostrador conveniente.”

E após apresentar o que viria a ser esta teoria da dor, também explica a sua utilidade, na qual estaria associada à detecção de erros ou incoerências das atitudes. Nisso estaria implícito praticamente a determinação de uma maneira devida de agir, no mais, uma função ética e, no mínimo, uma redução em nossas experiências. Para realçar a necessidade de tal teoria, demonstra com o exemplo da sua capacidade de prever o comportamento dos furacões ou mesmo do clima ambiente, como ela poderia ser bem aplicada. Porém a sensatez do autor é tamanha que contra-argumenta sua própria possibilidade dispondo o critério externo e simulado da dor enquanto sendo apenas uma direção e não o que se é conforme os teóricos da identidade, aquilo que dita como distinto daquilo que interpreta ou dos efeitos da dor.

Ao deixar de adotar as duas vias _ nem essa primeira na qual a emoção seria a própria dor, nem a segunda onde a emoção fosse diferente de seus efeitos _ , Dennett propõe a dor enquanto algo que atua no sujeito, mas não que necessariamente seja subjetiva, e que pode, inclusive, ser qualificada, além de já quantificada. Ainda assim reconhece a uniformidade consequente para tal programa de predição, mas não encara essa objetividade como algo diretamente influenciável no comportamento subjetivo do homem, ao responder que a descrição não está no âmbito equivalente à realização, mesmo que esta também o seja feita em um ambiente simulado, assim como continua a argumentação com o exemplo no qual “datilografar também não é falar” . O seu objetivo nesta parte do capítulo não seria defender a idéia de que um robô pode se tornar um homem, mas somente que a imitação da realidade humana seria possível, e não a sua identidade. O que nos propicia um limite muito estreito para o critério de diferenciação entre esta proposta científica e a realidade. Logo, o controle entre simulação e identidade se esvaem e poderíamos até perguntar se o argumento cartesiano, por exemplo, não voltaria à tona com essa tentativa de medida para a realidade: se as vontades do corpo seriam sempre concordantes com a crença da consciência, como ficaria então o caso da situação que Descartes nos coloca quando alguém tem sede mas sabe que não pode beber água? Também se poderia levantar a questão da liberdade humana frente ao determinismo de um simulador, assim como a biológica frente à somente física, conforme outro autor já estudado em neurociência já explorou .

Mas o próprio autor encontra tais dificuldades em sua articulação sobre essa questão de identidade e a contra-argumenta com a situação em que a dor é utilizada para sarar o envenenamento sob morfina ao invés da morfina ser o antídoto da dor, para ilustrar as dificuldades de caracterizar uma teoria da dor e sua função, discorrendo sobre as suas necessidades. Pois nem sempre o que vir a representar a dor, pode se corresponder com ela. Daí a ambiguidade entre a artificialidade e o sintético, por exemplo, que compartilham igualmente da questão anterior, entre simulação e identidade. Dennett questiona se o sintético da dor, que é quimicamente idêntico ao natural, por extrair suas propriedades do mesmo, está no patamar do artificial que, não necessariamente corresponde às propriedades químicas naturais do objeto simulado, ou se o sintético está no patamar do idêntico e “genuíno” ao objeto. Pois explica que a inteligência artificial sim, poderia corresponder à inteligência humana, porém a dor não se encontra somente no âmbito psicofísiológico, mas também à condição humana, de existência na qual as máquinas não possuiriam e, consequentemente, a uma moral:

“A dor real está ligada a um esforço para sobreviver, com a possibilidade real de morte, com as aflições de nossa carne delicada, frágil e sensível. Com nosso conceito de dor, assim como com muitos outros, há uma tendência para a paroquialidade.”

No entanto, discorre ainda se a distinção entre as clonagens e os robôs seriam somente as propriedades bioquímicas (orgânicas) na primeira e as inorgânicas na segunda, associando a mesma questão ética às duas e, reconhecendo o descontrole dos projetistas ou cientistas sobre esse aspecto:

“Uma razão, então, pela qual não podemos fazer um computador sentir dor é que nosso conceito de dor não é puramente psicológico, mas também ético, social e paroquial, de forma que o que quer que coloquemos dentro de nosso computador ou robô, não adiantará, a menos que leve consigo essas outras considerações, uma questãosobre a qual nosso controle , como projetistas de computadores, é mais que limitada.” .

Porém na movimentalção seguinte do texto, Dennett descarta a importância entre resolucionar a problemática dos sintéticos com relação à natureza pois retira a confusão existente entre a teorização sobre a dor e a sua imitação, concluindo seu argumento de que sua intenção é conceituá-la, e não retratá-la ou realizá-la. Também surge aqui, uma investigação das dissociações possíveis entre teoria e imitação. Para tanto, o autor se embasa na exposição de uma teoria da dor apresentada e discutida, por ele mesmo, por meio de contra-argumentos filosóficos levantados a respeito.

A segunda parte do capítulo é esta exposição de uma suposta teoria sobre os processos da dor. Dennett reconhece o teor especulativo desse estudo por ele citado, bem como a sua importância para encontrar advertência para o mesmo. O autor então dá continuidade àquelas duas vias expostas desde o início do estudo, mas aqui divide-as entre as Fibras A e C dispostas à porta de “Melzack-Wall” no caminho onde são percorridos os “outputs” de receptores ao Tálamo. E uma das características de distinção entre essas duas fibras é a velocidade das mesmas, onde A possuiria em média dois metros e seria amortecedora dos impulsos de C, o qual teria cem metros. As duas possuiriam caminhos também diversos, em que um caminho seria mais alto e mais característico da espécie humana ou daquelas com o córtex mais desenvolvidos e o caminho mais baixo seria despertado por músculos da retina. Dennett também explora a importância do sistema de ativação reticular para a atenção da sensibilidade da dor e do sono ou despertar, assim como de sua influência nas crenças despertadas pela dor, influenciando no estímulo doloroso sobre A ou C:

“Quando temos uma dor, acreditamos que temos uma dor (pelo menos, normalmente), e as dores podem ser lembradas, usualmente, por algum tempo… Sem dúvida, mesmo a apreensão mais intelectualizada do estímulo doloroso poderia ter algum efeito sobre os desejos, imediatos ou de longo prazo.” .

Em um âmbito quase conclusivo de depararmos a esfera dos desejo, da crença e especialmente do raciocínio enquanto produtos da dor. Raciocínios estes, não no nível de informação, mas somente de ruídos.

O decorrer do argumento a respeito dessa explicação da dor feita por Dennett é sobre a exposição desta teoria por ele especulada. Onde ele cita diversos contra-argumentos em resposta à criação do robô com dores. Primeiramente ele articula a diversidade nos estudos e teorias sobre a dor, os quais implicam em sua conceituação ou objetividade, dá exemplos das variadas formas de tratar uma dor: seja ao pensar e voltar a atenção na mesma para que ela passe, ou não pensar e desviar o foco de atenção para outra coisa com o mesmo intuito, afirmando que as duas possibilidades funcionam, daí a dificuldade em desenvolver as características de seu procedimento. O autor também relata como interpretamos a dor racionalmente ao identificá-la, percebê-la, e como os anestésicos podem ser provenientes da própria especificação do lugar da dor: ao detectá-la e excluir as partes mal localizadas por nós, aumentando seu potêncial somente no local carente. Assim como o fazemos por meio do mecanismo de pensar na própria dor para evitá-la. Tudo isso para nos demonstrar que a defesa em anestesiar somente o caminho baixo, pode ser mais viável em alguns casos em que anestésicos gerais não necessariamente anestesiam, mas apenas paralizam ou aminestizam, não provocando a paralização das sensações mas somente o seu esquecimento. Conclui com esses efeitos, a relação direta entre dor e anestesia, investiga a última com o propósito de descobrir a origem da primeira, respectivamente. Mas também encontra dificuldades ao caracterizar como os processos anestésicos se dão.

O percurso nos tipos de anestésicos gerais e seus efeitos também são investigados por Dennett afim de explorar a relação entre dor e consciência. Onde o autor examina que os anestésicos paralizariam os músculos e a sensibilidade nas situações de pacientes não conscientes, dando a entender que a dor depende da consciência . Mas em seguida responde que os efeitos da anestesia no córtex equivale não somente à paralização da consciência como, inclusive, da percepção e experiência:

“A hipótese de que a conclusão bem sucedida de um processo de análise perceptiva é um aspecto crítico de nossa explicação funcional da dor é, ao contrário, um produtor de uma variedade de explicações plausíveisde fenômenos complicados”.

Em seguida surge mais um argumento para deslocar a consciência enquanto causa da paralisação: o reconhecimento da dor pela memória, pois se não há como reconhecer o presente, não há como sentí-lo. De acordo com a frase citada por ele, de Mary Brazier: “Uma dor não reconhecida não é uma dor de modo algum”. Pois a recepção de estímulos desconhecidos muitas vezes não causa algo conhecido, de fato. E se chamarmos de dor, a mesma também seria desconhecida e inédita, em última estância. Ou seja, a experiência da dor é o resultado se um processo de “análise perceptiva”, em outras palavras, do registro do que foi sentido, psicofisiologicamente, de uma teoria sobre a dor. Teoria a qual, associada ao caminho baixo, seria o que condiciona a existência da dor e afirma a possibilidade de demonstrá-la.

A terceira parte é uma análise final da teoria exposta, onde se pergunta sobre a validade de tal teoria ser efetivamente uma teoria a respeito da dor. O movimento se inicia com a suposição de que a anestesia não fosse algo que páre a dor, mas que simplesmente não nos permita senti-la, prevenindo-a por meio do contato exterior, por exemplo. Uma espécie de hipnose onde a crença na dor seria a própria dor assim como a fala ou ruído fosse a sua manifestação da dor, aproximando-se ligeiramente de uma teoria da afectividade de Spinoza.

O desenvolvimento disso é a continuidade de Dennett articulando que, a dor em si também não aparece no diagrama, somente as suas causas e efeitos, pois talvez não haja algo além de sua descrição e função, retornando novamente a questões filosófico-gramaticais de ambiguidade tais como determinismo e liberdade , forma e conteúdo ou objeto e sujeito. E ainda: se a dor pode salvar o envenenamento por morfina, então a morfina não previne a dor? Eis o círculo vicioso das contradições que não suportam o problema. Para disseminar este impasse, o autor sugere o “dolômetro” o qual mede a dor e seus limites máximos afim de questionar se há niveis de tolerância da dor para que uns a sintam enquanto outros não e assim sucessivamente com as outras contradições. Porém surge neste momento do texto mais uma confusão desmistificada entre verdade-significado da dor, a qual abrange questões filosóficas a respeito dessa divisões, e não suas interpretações à maneira wittgensteiniana da lógica para além disso.

CONCLUSÃO

Após o caminho cansativo, enfim facilita a conclusão propondo somente um exame dos efeitos essenciais da dor, associando a essência à crença ou a capacidade de mostrar a dor, para que assim conclua que a crença pode ser substituída por maneiras pragmáticas de simular a dor num programa, mesmo que se saiba estar com uma dor e não senti-la (sob efeito de morfina, por exemplo), e assim passar da essência para a intuição de “estados naturais” onde se pode chamar algo de dor e não o tornar uma dor, mas enquanto não se conseguiu teorizar tais processos intuitivos, então conclui ainda não ser possíveis máquinas sentirem ou intuirem, ou mesmo nós homens se não possuimos ainda tal resposta para dizê-la (a dor). Dennett reconhece que o que nos incumbe à ela é a moral (paroquialidade), e isso ainda não abrange os robôs.

Logo, a intuição que fortalece os argumentos céticos quanto à impossibilidade de se construir um robô, também mostra a incoerência do conceito comum de dor. E essa vulnerabilidade não possibilita demais articulações filosóficas. Mas o autor não desiste em reafirmar uma via de futuras teorias em que se abranjam não somente o fisiológico como, quem sabe, o cultura moral e o intuitivo da dor, para que assim , e somente assim, a explicássemos:

“ Tais avanços na ciência, provavelmente, trariam consigo mudanças de larga escala naquilo que achamos de intuitivo sobre a dor, de forma que a acusação de que nosso robô apenas sofreria o que artificialmente chamamos de dor perderia seu carácter persuasivo. Enquanto isso (se houver uma defasagem cultural), as pessoas imaginativas evitariam de chutar tal robô.”


BIBLIOGRAFIA:

DANIEL C. Dennett. “Brainstorms” – Ensaios Filosóficos sobre a Mente e a Psicologia. Trad. De Luiz Henrique A. Dutra. São Paulo: Ed. Unesp.

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