domingo, 4 de setembro de 2011

Carta ao futuro

Como um fiapo saído dos cílios da lembrança, hoje veio me cutucar um cisco inquieto a querer despertar aquela mais pura esperança, teimou em cismar o roçar de um rio afetuoso e desejos árvores dançantes até que conquistou: coçou-me o instante de uma lágrima!


Estou dentro de uma mala e a chave virou semente de ilusões que florescem em alguns pés de abraços. A fechadura, muito menos, há um tempão ela deixou de existir e foi visitar seus antepassados, a história do mundo, e essas coisas todas intelectuais que costumam nos regrar para a libertinagem, de alguma maneira. Bom, entendi, depois de bater muito com a cara, as partes todas do corpo, o nariz e os cotovelos arranhados pelo couro dessa bagagem, que é ali dentro aonde vou ter de sobreviver durante um período suficiente para eu não me esquecer mais, lembrar de mim o tempo todo e seqüestrar minhas relações pessoais, de fato, para mim mesmo. Para que eu recupere o que guardei tão bem guardado dentro daqui de dentro, é preciso não mais tirar a roupa de fora e ser nua, mas vestir a pele do avesso. Encarar minhas entranhas, ir fundo até no meu superficial. Isto é só um exercício de descoberta, auto-conhecimento e valorização da auto-estima, por mais torturador que pareça. Tortura é o não. O não ser por mim. Ainda acredito em autonomias, liberdades, escolhas e sujeito. E não era nada disso que eu precisava te dizer. É somente sobre o esquecimento. Isto é um esquecimento, esse egoísmo todo é um esquecimento, e escrever pra mim sempre foi uma despedida, não um encontro.

Eu já esqueci demais a vida. É como se eu estivesse morta no passado, pois não tenho muita memória. Tudo anda automático e efêmero a ponto de eu não acompanhar minhas lembranças o suficiente, as coisas simplesmente expiram. Quando não há mais memória também não se suporta o esquecimento. Não concordo unicamente com o presente. O presente precisa do tempo, não está parado nunca. E eu preciso de passado, neste momento. Estou numa fase de entender um esquecimento que me veio imposto por encomenda, forçado com isso e somente por isso, a ser lembrado. Temos várias formas de organizar o que queremos lembrar, ás vezes é o conteúdo da lembrança que nos forma, ou transforma. Às vezes somos moldados e esquecidos por falta de memória. Sei que não quero mais me alienar de meu passado porque nele eu me encontrarei. Quando crianças ou mais novos, temos a tendência de idealizar e iludir nossa personalidade para formá-la, para almejá-la, para percorrer os caminhos que queremos. Estou exatamente no momento de passagem, em que já sonhei e percorri algo. É neste algo que me volto agora afim de me entender um pouco, nao somente com o que quero ser, mas com o que já fui e tenho até agora. Quero não trair a mim mesma, ser real. Nem somente ideal, nem somente material. A própria fechadura, também se virou para dentro, juntamente com a mala comigo presa lá, e é necessário recompor um universo para que eu me abra para o mundo novamente e encontre realmente tudo o que guardo do outro lado. O outro lado é o presente-passado, e eu o passado-presente, pois nos completamos, e os dois junto é que é o futuro. O limite é virtual e apenas uma ferramenta, sempre me foi apenas um espelho reflexivo. Nele podemos ser esquecidos ou lembrados, dependendo da perspectiva donde se olha.
E concluindo agora mais direta: estou numa crise de identidade sim. Tenho isso mais ou menos de quatro em quatro anos, pois adoro mudar para inclusive transformar o mundo. Sim, sou utópica inclusive com o amor. Nem sempre ele acompanha o mundo, a maneira como amamos hoje me soa muito ingrata e egoísta, mesmo essa livre é meio burguesa: nós podemos até ser livres, mas o amor ainda não o é, ele continua sendo um sentimento social e (per)seguido por todos, com as circunstâncias de todas as forças coletivas e morais. Sei que pra você não preciso falar tudo isso, mas isso que chamamos de amor ficou somente na lei da palavra, podemos sempre inventar sentimentos e relações e esse que é o melhor barato. Já me acho conservadora quando sinto coisas próximas ou imutáveis por pessoas, do tipo a necessidade de vê-las, de ter saudades, cultivá-las. Mas essa ânsia incômoda por mudanças pra mim é que é uma crise perturbadora, um sinal de que estou fugindo das coisas que já senti. É um sintoma do quanto me machuquei e preciso me perdoar pra aceitar meus sentimentos pelos outros.
Aceitar novamente até o amor convencional seria um passo de evolução. Esse é meu impasse entre: amar e ser. O amor não é, a gente é que ser. Vou contra meus princípios se amo sem rever meu ser, sem me redescobrir. E se eu fizer isso dentro de um amor, já estarei me traindo. Se eu não amar também, estarei fugindo. É como te falei, quero dar prioridade pra mim por inteira, não mais somente para o amor. E eu fiz muito isso de separar uma coisa da outra para me defender, pois adoro me entregar e ser intensa nos sentimentos, esquecer de mim. Mas antes disso preciso me amar primeiro, ou amar o amor. Uma relação se dá com duas pessoas inteiras e isso é o mais lindo, senão não há encontro, há leviandade e consumo. É uma questão de tempo isso, só, nada muito grave, mesmo. Mas é algo que precisa ser. E não pode ser ignorado ou esquecido, como me foi por muito tempo. Por isso é questão de tempo mesmo: de lembrar-me desse mim esquecido.
Você, uma das únicas pessoas que me permitiram ser egoísta a ponto de escrever e assumir tudo isso. Porque entrou, de fato, no meu coração e fez com que eu também me amasse por te amar. É incrível o quanto se reinstaurou toda uma vontade contida que eu tinha de ser, de acreditar. A certeza pra mim sempre foi incomoda até que eu a descobrisse nos sentimentos. Você é um sentimento. Único. O que já me coloca na velha maneira de amar egoistamente, e de idolatrar uma pessoa. Eu só sei amar, não consigo deixar ser amada, isso é um problema feminino. Mas tenho esperança que estou prestes a superar, se houver paciência e compreensão. Ao mesmo tempo não acho nada justo isso, pois sou leviana do mesmo jeito ao fazer isso com você, só por minha causa. Sei que por você não há problema e está muito livre desses impasses pequenos e individuais, mas me preocupo muito com as minhas intensidades sobre você, elas são perigosas e eu gosto muito de senti-las.
Eu sou viciada na linguagem do coração e como ele é capaz de se comunicar melhor do que nós. Isso me desequilibra bastante, ele se impõe mais do que eu. Ele te ama mais do que eu, ele foge dos meus pensamentos e do que acredito ou tento acreditar. Então resolvi buscar mais o que vivi do que o que sonhei, mais o que senti, e isso tem a ver com o amor porque tem a ver com o passado. O coração conta todas as batidas do nosso tempo, o que somos, fomos, queremos ser, o nosso ritmo interior e real, a coisa que mais nos conta. Vou atrás de ouvir a história que ele tem pra me contar já faz tempo...


Há um cisne flor embaixo de um sorriso arborizado de nuvens doces. Como eu nunca snookei essa lua desejada antes? Tão cheia de enamoros vazios de perplexidades minguantes. Cresce então essa cobiça nova novamente em mim. Licor carente de ainda mais humor? Mas toda a gaita de rancor que trago é por demais alucinógena, sulga teus suspiros todos. E ainda aguda, grita aguçante por qualquer orgasmo de instantes. Semente-me ter, meta isto não apenas lá na cabeça: jamais é acolhido o que somente planta. É verde a cama por isso: não é esperança. Mas brinca por favor com a minha conchinha na areia? Vamos nadar juntos. Banho de libidos eu aceito quando for de chuva suculenta que baba por um sol todo derretido. E a vida é assim, bolada pelos nossos sentidos a ser viajada de toda nisso. Desculpe a demora, é que a luz da minha cabeça não quer apagar e implora por não te esquecer de interruptor balançando na rede das minhas mãos. Não chora tua insônia para mim senão vou ninar o seu manto inteiro de bolas de sabão telepaticamente coloridas. Entre o meu sonho e a tua música sonífera e hipnotizante há nipes de baralho jogando RPG com damas de xadrez. E eu adoro todo esse flerte místico e infantil. Mas onde é que eu estava mesmo quando não me encontro em outro lugar senão aqui?

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