segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

wittgenstein: O USO DITO NO SENTIDO EXPRESSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

Campus Guarulhos
Aluna: Cristilene Carneiro da Silva
Disciplina: Filosofia da Lógica I
Curso: Filosofia
Professor: Marcelo de Carvalho
Período: noturno
Dissertação Final sobre o Tractatus Logicus Philosophicus de Wittgenstein:
O USO DITO NO SENTIDO EXPRESSO

São Paulo
26/11/2009





INTRODUÇÃO
No Tractatus, o significado dos símbolos, aparecem também, como delimitadores da descrição, mas ainda não como o objeto da fixação dos valores. Mas sim a variável proposicional dotada de sentido (“Sinn”), que os agrupa enquanto este objeto. A expressão (“Ausdruck”), mesmo exposta como constante para Wittgenstein, aproxima-se ou pode ser o próprio símbolo significador, porém ainda comporta o sinal (“Zeichen”), que é arbitrário e por isso causador de confusões filosóficas ou mesmo, de deliberações. Ela, a expressão, se aproxima do “uso” nas Investigações: “Um das Symbol am Zeichen zu erkennen, muS man auf den sinnvollen Gebrauch achten.” Ou seja: “Para reconhecer o símbolo no sinal, deve-se atentar para o uso significativo” , mas ainda aparece limitada pela forma geral da proposição. A expressão é o que valoriza o sentido impresso (sinal), é o uso significativo que o denota. Há, portanto, diferenças visíveis entre este uso articulado do sinal no Tractatus, que postula a filosofia à linguagem.

I

O “Sinal” é o objeto do pensamento, projetor da proposição possível. Já o “sinal proposicional” articula o sentido correspondente à realidade, V ou F da proposição, enquanto validade: “a proposição é o sinal proposicional em sua relação projetiva com o mundo” Aqui se investiga uma conseqüente distinção do valor ao “sinal”, mas somente à “proposição”. E o valor da proposição sinaliza o “sentido” dado pelo sinal proposicional projetado no mundo. A proposição possibilita o sinal, o projetado, mas estes não são fixos. Mas somente a proposição se estabelece no patamar da “significação”. O sentido está como que em potência na proposição, mas não necessariamente manifesto sempre e constantemente. Ele pode variar, mas quando interage com a realidade, é um fato . O sentido é empregado no sinal proposicional e compreendido, articulado, acontecido. O uso significativo do sentido é a sua expressão. Pois se a proposição possuir sentido (relacionar-se com o mundo), ela expressa algo no mundo de valor (afirmação ou negação), para além do seu significado (ordenado e registrado pelas palavras). Portanto, os sinais não necessariamente são palavras, apesar de se confundirem na escrita. O “nome”, porém, só possui significado na proposição, mas depende do sinal (dos sinais simples e dos primitivos) para possuir sentido próprio, e o sinal pode vir a ser um nome, o nome pode ser o próprio sinal, mas somente quando utilizado na proposição. Proposição aqui se refere às circunstâncias dos significados, em geral, às quais o nome se encontra contextualizado. Wittgenstein concebe o sinal como uma conseqüência da relação, ou ela própria, e não o que a causa . Por isso é variável, e também por isso não estabelece nada, não intitula, somente expressa algo. O Sinal proposicional ou sentido da proposição, por exemplo, podem ser vistos como “estado de coisas”, daí ele ser um fato, por ser independente das palavras mesmo quando figurado por elas. Os sinais proposicionais são símbolos (expressões) do pensamento, assim como o pensamento é símbolo da proposição e o sinal simples (ou signo), do nome.

Assim, a essência não mais se encontra no sinal, mas nas palavras (nomes) ou na definição (conceitos). O sinal é a situação, o estado de coisas, por isso é caracterizado como variável, pois “situações podem ser descritas, não nomeadas.” Pois o nome não alcança o sentido do significado articulado, expresso. Os nomes significam os objetos por meio dos sinais, mas os sinais também são simples, já a proposição é a análise completa (significada) deles. Os sinais para Wittgenstein estão próximos do que vem a ser os objetos. Pois os sinais também são figurados pelos nomes, assim como os objetos: “À configuração dos sinais simples no sinal proposicional corresponde à configuração dos objetos na situação.” O significado do objeto (nome) substitui o sinal e o objeto na proposição. O sinal simples configurado no sinal proposicional é o seu uso significativo, a proposição que contém significado, não o sinal. O sinal é um instrumento para a significação. Ele, expresso pela proposição, é a significação. A correlação dos nomes (os quais são os sinais simples aplicados no sinal proposicional) é a proposição, é a relação entre os sinais proposicionais, assim como o fato é a relação entre as coisas. No entanto, não há como mostrar/representar os objetos, exatamente, daí porque não há mais a essência enquanto Aristotélica, a essência está agora na linguagem que os nomeia, figurativamente. A essência está no significado, o qual se aproxima da estabilidade do objeto, não porque o valida verdadeiramente no mundo , mas porque descreve articuladamente as suas propriedades: “uma proposição só pode dizer como uma coisa é, não o que ela é.” A essência da proposição passa à descrição, não mais à ontologia nem à epistemologia. A descrição é significação não porque é associada à sua validade no mundo (V ou F), mas porque abrange as possibilidades figurativas de um fato por meio da linguagem, ou da forma geral da proposição, mas não necessariamente sua definição (e esta última é considerada somente como uma descrição que sintetiza um complexo ). E essa descrição articulada ou proposição (sinal proposicional, símbolo ou expressão) é que é constante, não mais suas propriedades (ou sinais primitivos).

II

Logo, o sentido omitido em potência no sinal é esmiuçado pelo uso significativo que o símbolo faz do sinal, a fim de expressá-lo. Com base na proposição enquanto a própria significação , pode se enxergar a definição ou os conceitos como o indivisível da proposição, a síntese descritiva e a análise completa da proposição, em outras palavras, o próprio significado afixado em um valor. Com a diferença de que a proposição é divisível, e a definição ou conceitos não. A distância, pois, entre o signo e a significação, é estreitada pela existência de “uma e apenas uma análise completa da proposição.” Porém, na passagem 3.261, Wittgenstein expõe outra distinção que melhor detalha a dissociação dos termos referidos, onde conclui a importância do “sinal definido” enquanto condutor dos outros sinais pela definição, mas sempre devido aos próprios sinais primitivos. Para facilitar a leitura, um suposto exemplo do que viriam a ser tal sinal definido pode ser especulado enquanto o nome, substantivo comum, por exemplo, “papel” e, seus sinais primitivos enquanto “branco”, “novo” etc. Estes últimos constituem inúmeros símbolos dependendo do sentido em que forem expressados para dizer algo sobre um nome definido. Entra aqui, o emprego significativo desses sinais, podendo inúmeros símbolos conterem mesmas características “brancas” ou “novas”, o que ainda não articula seus sentidos enquanto referidos a um significado. A análise completa da combinação entre tais sinais é que proporciona o sentido dos mesmos, mesmo que não validados enquanto fatos no mundo, são fatos possíveis de significação. Num esquema mais visual:

(uso de sentido no que é dito): Objetos -> sinais simples -> nomes definidos

(sentido expresso em significação): Nomes -> sinais proposicionais -> proposição

Nota-se que o que é dito não é o sentido e o sinal, mas o emprego dos mesmos na definição dos nomes, por ex. É a significação dos mesmos. A aplicação deles na linguagem. Os sinais não possuem papel de significar algo, mas são instrumentos utilizados para isso, ele se aproximam do fato e do objeto assim como de sua valoração no real (seu sentido no significado): “o que não vem expresso nos sinais, seu emprego mostra. O que os sinais escamoteiam, seu emprego denuncia.” A expressão (Ausdruck) liga, pois, o sinal (que nem sempre é externo e revelado como ela, numa oposição ao sinal) ao significado. Sendo ela aquilo que pode ser mostrado/representado, elucidado. A expressão se aproxima do sinal proposicional; “a cada parte da proposição que caracteriza o sentido dela, chamo uma expressão (um símbolo – ein symbol)” assim como também se aproxima da própria proposição: “a própria proposição é uma expressão)” . Expressão no Tractatus aparece enquanto sendo o projetado, o comunicado. Assim, a proposição, manifesta o sentido por meio do nome articulado: “é só no contexto da proposição que um nome tem significado”, e o nome ganha significado. “Na proposição, portanto, ainda não está contido seu sentido, mas sim a possibilidade de exprimi-lo. (o ‘conteúdo da proposição’ significa o conteúdo da proposição dotada de sentido). Na proposição está contida a forma de seu sentido, mas não o conteúdo.” Dando a entender esta expressão como próxima da figuração entre o objeto e a proposição, ou o conteúdo do sinal com seu sentido exposto na forma da proposição, simbolizado. “A expressão assinala uma forma e um conteúdo. ” Veja que, expressão e linguagem aqui se mesclam, porém não é a palavra “Sprechweise” ou “Sprache” a utilizada por Wittgenstein, mas sim “Ausdruck”. A expressão está associada com o limite da linguagem, sua essência: ela caracteriza a forma geral das proposições que a representa.

Em 3.312, Wittgenstein diz que a expressão é constante e é o que há em comum nas proposições. E conforme 3.314, se a expressão só tem significado na proposição, o sinal só tem significado quando expresso, ligando assim ao plano da significação proposicional e enlaçando-os aos limites da linguagem por meio da limitação dada pela proposição, mesmo que dando uma maior expansão às possibilidades da proposição. E logo em seguida, na 3.316 a explicação é sobre a proposição que, ainda subsiste em “valores fixados”, ou descritos, porém em 3.316 será dito que não é a “variável proposicional” o essencial que limita a proposição, mas sim a “forma comum da expressão”. Wittgenstein define a proposição em 3.318 como a função dessas expressões, nela contidas. Já o sinal é aquilo que é sensivelmente perceptível no símbolo (sinal proposicional ou expressão). Porém os modos de designação são diferentes dos sinais e dos símbolos, por isso podem ter sinais em comum, mas não mesmo desígnio, ou significado. O “uso significativo” do sinal confere o caráter singular dele transcrito, designado, expresso em símbolo. O sinal é desvendado pelo seu “uso significativo” [sinnvollen Gebrauch]. O sinal é utilizado para significar algo, mas não propriamente o que significa ou define os símbolos. O sinal pode possuir, no máximo, uma impressão, mas não um valor significativo (enquanto V ou F) como responde o filósofo às argumentações de Russel: sua tautologia paradoxal levaria a dizer que o sinal descreve a expressão e o significado, e não o contrário; a função da função não diz nada que não ela mesma. Wittgenstein trata a impressão contida do sinal não enquanto a representação de algo, mas somente dotada de um conteúdo propagador de sentido. Quem a expressará será o uso significativo feito sobre ela, por meio da proposição .

A distinção entre a validade e o sentido do nome estão feitas. O nome não pode ter significado porque não tem validade sozinho. O nome tem sentido, mas nem sempre significa: sem significado ele não tem validade na figuração, permaneceria como impressão na relação entre sujeito e mundo. “O nome é o que todos os símbolos que designam o objeto têm em comum... resultaria que nenhuma espécie de composição é essencial para o nome.” O valor não mais corresponde ao nome, ou ao conceito, para contra argumentar os socratismos. A essência não está mais no nome, mas sim no símbolo, na figuração e no significado. Mais abrangente: na forma geral da proposição. E no entanto, a significação do nome é arbitrária, mas “possível”, no sentido de entendível. A significação pode ser singular, porém já faz parte da essência (e do valor) do mundo.

Wittgenstein ainda não desmorona a lógica e a filosofia de todo neste movimento do livro, somente argumenta a respeito da confusão trazida a elas por meio da língua e principalmente, da mesma utilização significativa dos sinais para corresponder a mais de um símbolo, ou uma representação, equivocadamente . E inverterem também o conceito de expressão como denotativa e significação como comunicativa. Pois o filósofo alemão considera, já no Tractatus, que não existem definições gerais, mas sim sinais correspondentes, pois o que muda nas representações particulares não são o sentido, mas somente o uso da linguagem substituída ou traduzida em outras palavras de mesma significação, apesar de diferentes, ou o inverso. Mas o sentido permanece o mesmo, conforme argumenta em 3.344, o que significa no símbolo é o seu sentido em comum, a sua validade no mundo de acordo com os fatos ou não, não somente sua simples tradução ou reprodução. É o significado, pois, que se apresenta com validade sensível: “Na proposição o pensamento exprime-se sensível e perceptivelmente.” Porém não é somente a expressão e o símbolo que o significam, mas, principalmente o emprego do sinal que propicia seu conteúdo, seu sentido.

BIBLIOGRAFIA

WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus Logico-Philosophicus. Introdução de Bertrand Russell. Trad. de Luiz Henrique Lopes. São Paulo: EDUSP, 2008.

_ SANTOS, Luiz Henrique Lopes. “Estudo introdutório”.

_ RUSSELL, Bertrand. “Introdução”.

Notas:

Tractatus, 3.326.


Tractatus, 3.12.

Afirmação de Wittgenstein em 3.14 do Tractatus: “O sinal proposicional é um fato.”

“ ‘O sinal complexo ‘aRb’ diz que ‘a’ mantém a relação ‘R’ com ‘b’, mas: que ‘a’ mantenha uma certa relação com ‘b’ diz que aRb.” ( Tractatus, 3.1432)

Tractatus,3.144.

Tractatus, 3.21.

O sentido da proposição não é mais condicionado à sua validade, a validade, porém, ainda provém do sentido. A respeito da tese da independência do sentido de uma proposição com respeito a sua verdade ou falsidade: “Dizer que uma proposição pode, em princípio, ser verdadeira ou falsa é dizer que ela, por exprimir um sentido, pode ser, em princípio, verdadeira ou falsa. Que ela exprima um sentido não pode, pois, depender de ser efetivamente verdadeira ou falsa. É porque uma combinação de sinais diz que as coisas são ou não são assim ou assado que ela vem a ser verdadeira ou vem a ser falsa, e não vice-versa.” (SANTOS, Luiz Henrique Lopes. “Estudo introdutório”. In: WITTGENSTEIN, L. Tractatus p.20,)

Tractatus, 3.221

Tractatus, 3.24.

Ou como Wittgenstein a caracteriza enquanto “maneira determinada”, “claramente especificável”, “articulada” em 3.251 do Tractatus.

Tractatus, 3.25.

Tractatus, 3.262.

Tractatus, 3.31.

Tractatus, 3.31.

Tractatus, 3.13.

Tractatus, 3.31.

Afim de não confundir aqui, uso com utilitarismo, Luiz Henrique Lopes observa bem no seu ensaio introdutório a respeito do Tractatus que distancia Wittgenstein de quaisquer cientificismo ou epistemologismo: “O que Wittgenstein pretende invalidar não é um ou outro modo particular de foormulação de um ou outro problema filosófico particular, mas toda e qualquer formulação de todo e qualquer problema filosófico que o revele como algo análogo a um problema científico, que o faça consistir no problema de saber como representar corretamente algum domínio de objetos ou fatos.” (SANTOS, Luiz Henrique Lopes. “Estudo introdutório”. In: WITTGENSTEIN, L. Tractatus, p.15.)

Assim como Bertrand Russell observa na introdução do Tractatus: “O objeto da filosofia é o esclarecimento lógico dos pensamentos.” Desprovida de significados, a filosofia torna-se quase o objeto da linguagem pela argumentação de Bertand Russell sobre a impossibilidade de dizer algo sobre a filosofia, mas somente de mostrá-la, expõe a filosofia como o que há entre um fato e a figuração dele. (RUSSELL, Bertrand. “Introdução”. In: WITTGENSTEIN, L. Tractatus, p.117.)

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